“A depressão é a doença do século”: é o que pelo menos dizem os analistas de plantão na área de saúde em infindáveis reportagens. Pior do que as doenças cardiovasculares, as neoplasias (cânceres) e as causas externas (acidentes, violência etc), a depressão é uma doença silenciosa, que não deixa sinais físicos visíveis e cuja única manifestação pode ser o suicídio, quando, no caso, já seria tarde demais…
Algo em torno de 20 milhões de brasileiros e uns 130 milhões, em todo planeta, sofrem dessa enfermidade, segundo dados oficiais do Ministério da Saúde e OMS. A região Sul, possivelmente por razões climáticas e culturais, é a região brasileira onde mais existem depressivos. Difícil de diagnosticar, e fácil de forjar, trata-se de doença da moda, muitas vezes tratada desnecessariamente por vários motivos sobre os quais não me alongarei neste texto.
As causas da depressão variam, desde complicações de quadros neuróticos a problemas de transmissão neuroquímica cerebral. Dentre os aspectos psicológicos que compõem o quadro depressivo, estão o apego e saudade. Muitas vezes o depressivo se tranca dentro da gaiola do passado, por medo e negação do presente e do futuro. O depressivo pode assumir a posição de gozar com a própria dor, porquanto deseja assumir o papel de vítima a fim de se sentir protegido e blindado, escondendo de si mesmo que muitas vezes ele é o maior agente da sua dor e ele mesmo pode modificar o seu destino.
Em uma das nuances dos quadros depressivos está a distimia. Descrita nos manuais psiquiátricos como uma forma leve de depressão, atingindo cifras de até 5 a 6% da população mundial, o distímico é tido como um mau-humorado crônico, cuja convivência pode ser insuportável ao lado de outras pessoas. Ao contrário do depressivo clássico, que muitas vezes fica visivelmente abúlico, o distímico – normalmente um estressado crônico – usualmente não consegue perceber a sua doença, tampouco fica tão prejudicado no seu cotidiano. Outra característica usual do distímico são os extremos emocionais frente aos problemas do dia-a-dia: é comum que enxergue tudo cinzento, que veja a realidade mais dura e mais difícil do que realmente é. Maioria dos distímicos, também, costumam gozar na sua própria condição mental, como por exemplo, o cara que num dia se queixa da vida por não ter muito dinheiro, deixando de viver por causa disso; e no dia em que ganha na loteria, passa a queixar-se, acintosamente, de que o dinheiro tirou-lhe a tranquilidade, pois passaria a ser objeto da cobiça de ladrões. Nada está bom para o distímico e nunca estará. Há mais detalhes a considerar sobre as duas doenças, mas isso escaparia ao objeto dessa Coluna. De forma geral, é mais ou menos isso.
Recentemente, o presidente Apóstrofo, mandatário do EC Bahia, tem sugerido que o torcedor tricolor é corresponsável pela má fase do time (que ele mesmo montou) dentro de campo. Pululam, nas redes sociais, postagens indignadas de internautas falando do torcedor corneteiro, daquele que só vai para vaiar ou falar mal. “Deixa o homem trabalhar” é o que argumentam os contra-críticos. De fato, torcedor vaia o primeiro passe errado aos cinco minutos de jogo, mas não entra em campo, não faz gol, não marca, não cobra falta, nem lateral e nem escanteio, tampouco pênalti. Torcedor não toma frango nem se arrasta em campo. Eis a maior de todas as falácias costumeiramente ditas por presidentes de clubes quando pressionados.
Torcedor não pode ser culpabilizado pelas derrotas para tupis, brasis, vilas novas nem londrinas, mas, analisando psicológica e psiquiatricamente o fenômeno, entendo que o comportamento do torcedor é consequência e não causa da mediocridade do Bahia nos últimos 20 a 25 anos. Mediocridade que deve também ser analisada contextualmente, o que faremos na próxima coluna.
Torcedor do Bahia é saudoso de quando arrebentava os adversários e raramente perdia na Fonte Nova, quando usualmente chegava em fases mais avançadas dos campeonatos brasileiros, quando quase sempre espancava o Canabrava em qualquer competição. “Sou bi brasileiro” é o passado que não volta, e é o passado ao qual o torcedor se prende. Faz-se de vítima quando culpa dirigentes do passado e do presente pelos fracassos, em vez de tentar se engajar mais e propor alternativas factíveis para o contexto nordestino (não-aceitação da sua própria realidade e desejo de repetir modelos que deram certo no passado). Quer voltar aos anos oitenta, mas se esquece que essa época já gerou filhos, quiçá netos. Já não vibra mais como antes, porque não tem mais forças para reclamar. Goza na própria dor, quando se lembra dos tristes tempos de Série C, lembrando-se até dos craques internacionais Pantico e Adelino, os quais vestiram nosso manto há não muito tempo…
Depois de tanto apanhar, seja dos adversários (mormente o rival) ou de dirigentes incompetentes, o torcedor passa a ter uma postura hiperssensível. Passa a criticar acintosamente todo e qualquer tipo de iniciativa da diretoria do clube, quer sejam contratações quer sejam feitos nas áreas-meio. Em campo, muitos jogadores tão criticados acabaram parando em outros clubes, virando ídolos. Será que o Bahia faz mal ao boleiro? Será que o clube é tão ruim assim de se trabalhar?
Isso para não falar das profecias de que o Bahia vai virar Ypiranga ou vai fechar as portas, eternamente na Série D: não virou Ypiranga com a Série C, não é agora que vai virar. Eis o exemplo das reações exageradas.
O torcedor tricolor, diante da mudança de realidade, deve exigir, sim, a pleiteada volta à condição de protagonista nacional, mas antes de tudo, precisa comparecer, no sentido figurado, ao divã para conhecer a si própria. A geração mais jovem que viu o Bahia “grande” está ficando quarentona, quiçá cinquentona ou sessentona, e tende a endurecer seus próprios conceitos de vida. Torcedor do Bahia é triste. É depressivo e distímico. Perdeu totalmente a referência de si mesmo e do clube que ama.
Nesta semana, mais um exemplo da distimia do torcedor do Bahia: vaias fortes a uma equipe de Sub-15 que perdera uma competição nacional frente ao Flamengo carioca. Justamente no momento em que os garotos precisam aprender com as frustrações. Que tipo de atleta esperamos formar com uma torcida assim?
Saudações Tricolores!
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