Não é soberba afirmar que a final do Nordestão deste ano é a mais fácil de todos os tempos para o Bahia. Trata-se de uma obviedade, tendo em vista 1) o abismo que separa Bahia e Confiança nos aspectos técnico e financeiro, bem como na hierarquia histórica e atual do futebol nacional, e 2) que tamanha disparidade jamais aconteceu em nenhuma das nove finais disputadas anteriormente pelo Bahia na competição.
Mas todo e qualquer favoritismo precisa ser confirmado dentro de campo. Bem disse um ex-treinador tricolor de tristes memórias: o cemitério do futebol está cheio de favoritos. E vale lembrar: antes desta, a final teoricamente mais fácil disputada pelo Bahia no Nordestão foi em 2018, contra um Sampaio Correa que terminaria o ano rebaixado para a Série C, e o Bahia perdeu.
A final deste ano vale muito. Vale isolar o Bahia como o maior campeão nordestino de direito. Já o é de fato, pois os títulos do rival nas esvaziadas e melancólicas edições de 2003 e 2010 carecem de substância, e esta importante nuance é bem menos enfatizada do que deveria no debate público. Mas é inegável que a oficialidade tem seu apelo e, ademais, o Sport e os cearenses estão apenas a um título de nós.
O Bahia nasceu para ser o maioral do Nordeste: tem a maior torcida entre os clubes nordestinos, é o único da região campeão (bi) na elite nacional e é hegemônico nos confrontos diretos contra todos os adversários regionais, sem exceção. Isolar-se, de fato e de direito, na dianteira das conquistas da Copa do Nordeste é, portanto, parte de seu destino manifesto.
Há, pois, muito em jogo nesta final e o torcedor anseia por esse título, que, ademais, proporcionaria uma dobradinha (título baiano + título nordestino) que não acontece desde 2001.
Contudo, tem uma pedra no meio do caminho para a consagração tricolor na Copa do Nordeste, e ela tem nome e sobrenome: Rogério Ceni. Seu planejamento altamente questionável para a semana do Bahia coloca em risco o Nordestão mais fácil de todos os tempos e a consolidação de nossa hegemonia na competição, tão avidamente desejada pelo torcedor tricolor.
Todos enxergaram que o Bahia deveria poupar contra o Mirassol, pois o time titular vinha de uma maratona exaustiva de jogos, estava no limite da capacidade física e teria uma final por disputar logo na sequência, que, por mais que seja contra uma equipe do meio da tabela da Série C, é uma final e vale muito. Todos, menos Rogério Ceni.
Façamos um exercício especulativo: qual seria o prejuízo de uma derrota para o Mirassol com uma escalação alternativa? Quase zero. Após nove jogos de invencibilidade, a derrota naturalmente viria em algum momento, não comprometeria a permanência no G4 da Série A e haveria o atenuante de o Bahia ter jogado com uma equipe alternativa, visando recuperar fisicamente o time principal para a sequência da temporada e para os dois bens maiores que estariam em disputa logo em seguida: o título regional e a inédita semifinal da Copa do Brasil. Acrescente-se que Ceni poderia, contra o Mirassol, ter começado a dar ritmo de jogo aos jogadores recém-contratados que não podem mais ser inscritos na Copa do Nordeste.
Mas o treinador tricolor, na contramão da lógica mais comezinha, foi para a partida em Mirassol com força máxima, seu time exaurido tomou um vareio desmoralizante e ainda perdeu Erick Pulga, contundido. Além disso, desde antes da debacle no interior paulista, Ceni já sinalizou que escalaria em Aracaju um time “diferente de tudo”.
Cumpre recordar: na primeira fase da mesma competição, o Bahia também enfrentou o Confiança em Aracaju com um time “diferente de tudo” formado inteiramente por jogadores da equipe Sub-20 e tomou 2×0; não obstante, o comandante tricolor anuncia a adoção de estratégia similar em plena final, optando decididamente por flertar com a tragédia. Uma decisão temerária que causa frio na espinha do torcedor, ao fazer uma final teoricamente fácil se tornar preocupante.
Na entrevista após a acachapante goleada contra o Mirassol, embora admitindo que escalar a força máxima foi um erro, Ceni demonstrou uma incômoda falta de sintonia com as expectativas do torcedor. Em resumo, desdenhou da final tão ansiada pela torcida, tratando-a como um fardo, que impede o descanso do time na Data Fifa; afirmou também (pasmem!) que vai para Aracaju para fazer um jogo de sobrevivência – contra o “poderoso” Confiança – e que vai tentar o título no sábado. O “tentar” de Ceni soa como um “se der, deu; se não der, tudo certo”. Uma postura que beira a indiferença e que vai de encontro ao torcedor tricolor médio, que enxerga esse título como uma obrigação e qualquer desfecho diferente disto como inaceitável.
Se o terrível vexame de Mirassol for seguido por outro, a saber, o de perder a final do Nordestão mais fácil de todos os tempos para um time do meio da tabela da Série C, as decisões equivocadas do treinador tricolor terão sido o fator determinante tanto em um caso quanto no outro. Portanto, não é exagerado afirmar que se o Bahia não conquistar o título, será inevitável que grande parte da responsabilidade recaia sobre as escolhas de Rogério Ceni, com seu planejamento incoerente e sua falta de sintonia com os anseios da torcida.





comentários
Aviso: Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do ecbahia.com.
É vetada a inserção de comentários que violem a lei, a moral, os bons costumes ou direitos de terceiros.
O ecbahia.com poderá retirar, sem prévia notificação, comentários postados que não respeitem os critérios
impostos neste aviso ou que estejam fora do tema proposto.