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Ex-lateral cede longa entrevista e alerta para vaidades no clube

Notícia
Entrevista
Publicada em 1 de março de 2016 às 13:27 por Antonio Alvim

De Raphael Carneiro, para o globoesporte.com:

“Um grande trauma físico, dado como acabado pelos companheiros, abandonado e, com as próprias forças, renascido para a vida. Em semana de premiação do Oscar, o internauta pode muito bem associar os relatos ao explorador Hugo Glass, atuação que rendeu a Leonardo DiCaprio a primeira estatueta da vida. Mas esta é outra adaptação da vida real. Ávine Júnior Cardoso, que encarnou o Menino Maluquinho no longa metragem do Fazendão, teve enredo similar ao do personagem que dá vida e razão de ser ao Regresso. E, assim como na produção norte-americana, o lateral-esquerdo precisou vencer uma longa caminhada para chegar ao seu destino. Mas com desfecho bem diferente.

O urso que destruiu fisicamente o explorador e alterou o rumo de sua vida foi substituído pelo joelho do jogador na produção soteropolitana. Ou melhor, pelo médico que, segundo o atleta, cometeu uma barbeiragem durante a cirurgia. O plot twist da vida real aconteceu em doses traumáticas. Primeiro, a lesão no segundo semestre de 2012. Nas tomadas seguintes, cirurgia conturbada, dificuldade na recuperação, três anos afastado e a redenção. Mas aí, uma das curvas que distinguem o enredo. Ao contrário do abandonado Glass, Ávine teve o suporte do clube para se recondicionar, mas, segundo ele, a recuperação veio por conta própria.

– Uma coisa que ninguém sabe e que eu nunca falei, estou falando agora, mas eu me recuperei mesmo, de verdade, não foi no clube, foi fora do clube, com profissionais fora do clube – revelou em entrevista exclusiva ao GloboEsporte.com.

Os pontos de cruzamento das duas histórias não param por aí. O respeito do personagem de Leonardo DiCaprio é conquistado pela experiência no terreno selvagem. No Fazendão, não havia jogador com mais conhecimento do local do que Ávine. Dos 28 anos de vida, o mineiro de Aimorés passou 14 deles entre os muros do centro de treinamento. Foram 10 anos como profissional do Esporte Clube Bahia – o hiato foi em 2009, quando foi emprestado ao Santo André.

Em um roteiro cronológico, o Menino Maluquinho debutou no dia 1º de fevereiro de 2006, quando substituiu Galego em um jogo contra o Atlético de Alagoinhas. A última vez foi em 16 de setembro de 2015, contra o Ceará, no Castelão. Neste jogo, a melancolia de um gol contra. Em dez anos, 231 jogos, 17 gols, dois acessos (para a Série B em 2007 e Série A em 2010) e o feito de ter sido o último atleta a balançar as redes da antiga Fonte Nova.

Protagonista de sua história, Ávine recebeu o GloboEsporte.com no primeiro dia após o fim do contrato com o Bahia. Em sua primeira entrevista como ex-atleta do clube, o lateral relembrou alguns momentos, criticou a diretoria, confirmou ter feito um acordo para não processar o clube e não descartou defender o Vitória.

Fala tranquila, alguns segundos de reflexão antes de cada resposta e a aparência de quem não coloca uma palavra fora do lugar. Religioso e recuperado, Ávine vai buscar a continuação de sua história em outro cenário. No desfecho da obra de arte da vida do lateral, mais um ponto de diferenciação com o cinema. Não é a vingança, mas o futuro que está nas mãos de Deus.

Confira abaixo a entrevista completa.

Após 14 anos, qual a sensação como ex-jogador do Bahia?
– É meio difícil ainda, até porque foram 14 anos. Então, meio que a ficha ainda não caiu. É difícil falar agora, nesse momento, sobre tudo isso que está acontecendo. A vida continua, e a gente tem que encarar da melhor forma, até porque eu tenho que procurar o melhor para mim.

O momento mais marcante no clube?
– Tenho tantos momentos. Momentos bons que eu passei dentro do clube. Mas o momento que não vou esquecer, não somente eu como o torcedor, que foi subir o Bahia. E todas as vezes que o Bahia precisou de mim, eu estava lá para ajudar. E, naquela ocasião, o que o torcedor queria era que o Bahia subisse para a Primeira Divisão, e eu tive esse privilégio.

Algo que queira esquecer?
– Esses momentos que eu passei de lesão. Esses momentos foram os mais difíceis, mas também serviram de aprendizado, tanto como pessoa quanto profissional. Serviu de aprendizado, mas eu não quero lembrar mais nunca desses momentos, porque hoje eu estou muito bem.

Como avalia o tratamento do clube para com você?
– Olha, os profissionais que lá estão sempre estiveram dispostos a ajudar. Não posso negar isso também. Tanto médico, fisioterapeuta. Todos os meninos sempre estiveram dispostos a me ajudar. Mas, uma coisa que ninguém sabe e que eu nunca falei, estou falando agora, mas eu me recuperei mesmo, de verdade, não foi no clube, foi fora do clube, com profissionais fora do clube.

Como avalia seu comportamento como jogador do clube?
– Foi difícil, até porque eu sempre procurei buscar o melhor para me tratar, sempre buscando opiniões diferentes, porque eu ouvi algo dentro do clube de um profissional que me deixou muito triste, muito puto ao mesmo tempo, porque eu ouvi algo do profissional dizendo que já não sabia mais o que fazer comigo para me recuperar. A partir do momento que um profissional da área fala que não sabe mais o que fazer para te recuperar, você tem que buscar opiniões de profissionais fora do clube. E foi isso que eu fiz. Eu procurei um profissional fora do clube, um fisioterapeuta, pessoas que me ajudaram muito, me acolheram de braços abertos na época. Até hoje faço tratamento com eles, faço treinos com eles para dar continuidade no trabalho. E muitas das vezes as pessoas não sabem. E foram com essas pessoas que eu pude me recuperar e voltar a jogar futebol.

Você falaria qual foi esse profissional?
– Poderia falar, mas não quero falar para não prejudicá-lo, para não expor essa pessoa, porque também essa pessoa sempre se dispôs a ajudar, mas depois que falou isso eu guardei comigo, e depois de tudo outros atletas vieram me falar também e eu fiquei sabendo de outros atletas também que já não sabiam mais o que fazer comigo, que eles tinham dúvida se eu ia voltar mesmo ou não. E foi daí que eu parti para outra, fui procurar outros profissionais. Graças a Deus, esses profissionais que comigo estão me ajudando até hoje, eu pude voltar a jogar futebol.

Foi prejudicado pela cirurgia?
– Sim, de certa forma, sim. Era uma cirurgia simples de se fazer. Hoje em dia você faz uma cirurgia de menisco e sai andando do hospital. E comigo foi diferente. Essa cirurgia me prejudicou muito, até porque já tinham outros clubes interessados, que já tinham me procurado. E já tinha 99% de ir para outro clube e, por conta dessa cirurgia, não deu certo. Então me prejudicou muito, sim. Mas hoje eu estou com a cabeça legal, feliz com a minha família e pronto para poder atuar.

Na sua última renovação de contrato, você fez um acordo com o clube como forma de te “indenizar” e descartar um processo. O que te levou a fazer isso?
– Primeiro, que eu já não tinha isso em mente, de colocar o Bahia na justiça. E, como eles tinham muito medo de não renovar comigo por causa disso, foi feito justamente esse acordo por causa disso. “Ah, já está todo mundo com medo achando que eu vou colocar o Bahia na justiça, então faço um contrato, eu assino, e pronto”. E acabou. Foi isso que foi feito. E é isso que eu quero. Quero continuar minha vida, continuar o que quero fazer, que é jogar futebol. Queria muito continuar para poder provar para alguns que acham ainda que eu não tenho condições, mas, infelizmente, o meu contrato não foi renovado e eu teria que fazer isso em outra equipe.

O que é o Bahia para Ávine?
– Primeiro que eu cheguei muito novo no Bahia. O Bahia faz parte da minha vida. Aonde eu for, vou estar torcendo, vibrando com os torcedores, mas o Bahia, para se manter no topo, entre os grandes, o Bahia tem que ter pessoas com pensamentos grandes, com atitudes de pessoas que querem ver o Bahia lá em cima mesmo, de verdade. Algumas atitudes que eu vejo dentro do clube, que não vão levar o Bahia a lugar nenhum, profissionais que se acham melhores que todos lá dentro, que se acham donos do Bahia hoje. Então essas pessoas não estão nem um pouco capacitadas para estar dentro do Bahia.

Quais atitudes?
– É notório, todo mundo está vendo o que está acontecendo. Eu não quero ficar aqui falando para não dar direito de resposta a nenhum deles e para o torcedor não ficar achando que, por eles não terem renovado o meu contrato, eu quero ficar botando lenha na fogueira ou algo desse tipo. Eu não quero ficar falando de A ou de B. Torcedor não é besta, ele sabe muito bem quem é quem dentro do clube. E se não sabe, procurar saber. Porque, do jeito que está, o Bahia pode ser prejudicado e muito.

Fez muitas amizades no clube? Quem se tornou o melhor amigo?
– Rapaz, tem muitos. Tantos jogadores como funcionários que já passaram pelo clube e que estão no clube agora. De jogar, tem os da minha época, que surgiram comigo, que eu tenho contato até hoje. Vou procurar levar para vida toda, que é o Ananias, tem Danilo Rios, Bruno César. E nessa geração agora que o Bahia subiu para a Série A, que tem Moraes, Rodrigo Grahl, Jael, Adriano. Então são muitos jogadores que eu tenho amizade e procuro manter essa amizade saudável. E, dentro do clube, tem funcionários de coração enorme, que procuram manter alegria dentro do clube, um astral 100%, energia boa, que eu tenho contato e vou procurar manter por onde eu for.

Pronto para atuar por outro clube?
– Hoje eu posso dizer que estou 100% para atuar em qualquer equipe, em qualquer clube. Nunca me senti tão bem como estou me sentindo agora. O trabalho que eu vinha fazendo com esses profissionais fora do clube me deixou muito feliz, por ver que o trabalho estava dando efeito, me deixando em uma condição boa. Hoje agradeço muito a eles, que são o Fábio, o Anderson, que têm uma equipe de médicos que também estão me acompanhando, doutor Gustavo e doutor Marcelo, que me deixaram em uma condição muito boa para atuar. Eu agradeço a eles também por tudo e hoje posso dizer que estou bem, não sinto mais nada, que é o mais importante. Antes, quando eu treinava e fazia algum esforço físico, sentia dor no joelho e não conseguia fazer nada. Então, hoje, eu não sinto mais nada e estou 100%, graças a Deus.

Jogaria no Vitória?
– Muitas pessoas já me fizeram essa pergunta e ainda fazem. Encontrei um torcedor um dia na praia, e ele me disse que, de todos os clubes por onde eu poderia jogar, só não poderia ser no Vitória. Mas eu disse a ele que eu sou profissional. A minha família precisa de mim. Eu jogaria sim, com certeza. Muitos podem não entender isso, como já tiveram vários ídolos do clube que jogaram lá e vice-versa. Então, nós somos profissionais e nossas famílias dependem da gente. Então, eu acho que cabe a eles quererem entender ou não, mas eu jogaria sim.”

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