Texto de Marcelo Sant´Ana, no Correio da Bahia deste domingo:
`Em rápidos movimentos de perna, como se corresse sem sair do lugar, ele ganhava aceleração suficiente para lançar a bomba. Os segundos eram a única coisa que separavam aquele homem da bola, durante a cobrança de uma falta que deixava torcedores perplexos. O tempo até a bola chegar ao fundo do gol ou a enorme distância que ela passou distante do alvo jamais foram cronometrados ou medidos. Mas a sensação que aquela cena causava na Fonte Nova bastou para o radialista Sílvio Mendes batizar Lima Sergipano como “O canhão do Fazendão”. “Ficou para a história e na cabeça do torcedor”, dispara, com discreto sorriso, aos 38 anos, o atual capitão do Confiança.
De onde veio tamanha força, nem o próprio personagem soube explicar. Entretanto, talvez a violência que descarrega no trato ao objeto de trabalho seja produto da adolescência, quando trabalhou como açougueiro na cidade de Itabaiana, no interior de Sergipe _ foi necessário apenas trocar as mãos pelos pés. “Sempre chutei forte, mas não tinha direção. Quando fui para o Bahia, clube mais estruturado, fui aprendendo e ajustando o chute. Depois de calibrado, os gols começam a sair”, recorda, orgulhoso pelos 84 gols que o colocam como o 15º artilheiro da história tricolor, à frente de qualquer jogador de marcação e também de ídolos como Bobô, Charles, Zé Carlos, Mário, Marito ou Jorge Campos.
A relação com a camisa azul, vermelha e branca começou em 1991, quando o ex-presidente do Itabaiana, José Rocha, o indicou ao colega deputado Paulo Maracajá. Em Salvador, foi colocado para dividir apartamento com os ídolos da época, Naldinho, o arisco ponta, e o meia Luís Henrique, último jogador do Bahia a ser convocado para a Seleção Brasileira, além do zagueiro Jorginho, irmão de Júnior Baiano. “Eu só era mais um perto deles. Parecia o segurança”, explode em risos. “Com o tempo, busquei o meu lugar e as pessoas olharam com outros olhos até que um dia começaram a me parar na rua”.
Felicidade – Lima Sergipano não esconde a felicidade de ter sido destaque do Bahia, clube que o hospedou nos melhores hotéis do país e que o levou a países que nunca imaginou conhecer, como França, Honduras, El Salvador, EUA, Costa Rica, e até Togo, na África. Para ele, o carinho foi reflexo do espírito de luta, algo que o Bahia vem perdendo com o tempo. “A torcida do Bahia gosta de jogador que dê a vida mesmo, que se entregue de corpo e alma, que rale. Eu fazia isto direto e quando perdia chorava, não dormia”, ilustra.
“O canhão do Fazendão”, com o carimbo de nascimento de 21 de março de 1968, só não venceu a batalha contra a teimosia do treinador Evaristo de Macedo. Se o velho mestre o intitulou capitão em 1995, também foi o responsável por mandarem negociá-lo em 1998 e em 2000. “Coisa de Evaristo”, resume. “Ele brigava até com vocês tudo da imprensa… Tinha aquele menino da TV Bahia, Zé Eduardo, o Bocão; o (José Carlos) Mesquita, do Correio da Bahia, imagina? Que figura Evaristo, viu?”, sorri do passado que não lhe foi grato.
Se o técnico campeão brasileiro em 1988 não o quis, o atual comandante tricolor o abrigou duas vezes em sua tropa. À exceção da ida para o São Bento/SP, em 1994, foi Mauro Fernandes quem sempre o contratou quando o Bahia fechou a porta: primeiro foi para o Sport, em 1998; depois, ABC, em 2000. “Mauro é um homem muito bom, exigente demais, mas a pessoa que trabalha certo com ele se dá bem”, aposta, recordando a quinta colocação no Brasileiro da Série A com o rubro-negro pernambucano.
De bom do Bahia, Lima ainda guarda fitas de jogos, matérias na imprensa, o carinho da torcida Bamor e o ensinamento de Paulo Rodrigues: “O importante não é apenas correr, mas jogar”. De ruim, uma dívida de direitos de arena e problemas com o FGTS que o tricolor reluta em quitar. “Tinha tudo para acabar meu vínculo de uma forma bonita, mas foi besteira. O dinheiro era pouco para o Bahia”, lamenta o homem que conserva o mesmo rosto da época que vestia a camisa 5 do adversário desta tarde. “É por isto que ainda não parei. Olho as fotos da época do Bahia e não mudou nada”, diz, em um lapso sobre a atual divisão do Bahia. “Mas Bahia é Bahia até na quinta divisão”, retruca, fuzilando com os olhos´.
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