Publicado no Bahia Já, por Nestor Mendes Júnior
Um dos melhores escritores da atualidade, o moçambicano Mia Couto, publicou semana passada uma artigo com o seguinte título “E se Obama fosse africano”, onde fala do júbilo entre os africanos da vitória de Obama Barack.
“Depois de uma noite em claro, na irrealidade da penumbra da madrugada, as lágrimas corriam-me quando ele pronunciou o discurso de vencedor. Nesse momento, eu era também um vencedor”, escreveu Couto em sua crônica emocionada.
E nesse mesmo tom corria a pena inspirada do autor de O Último Vôo do Flamingo: “Na noite de 5 de Novembro, o novo presidente norte-americano não era apenas um homem que falava. Era a sufocada voz da esperança que se reerguia, liberta, dentro de nós. Meu coração tinha votado, mesmo sem permissão: habituado a pedir pouco, eu festejava uma vitória sem dimensões”.
Contudo, o escritor se deparou com o texto de outro escrevinhador, o camaronês Patrice Nganang, intitulado: “E se Obama fosse camaronês?”.
As questões então levantadas por Nganang e, depois por Couto, gravitam em redor da hipótese de Obama ser africano e concorrer à presidência num país africano.
Entro no circuito e adapto a pergunta para a realidade do nosso Esporte Clube Bahia: E se Obama fosse baiano e candidato à presidência do Bahia?
1. Se Obama fosse baiano, um seu concorrente (um qualquer Maracajá) inventaria mudanças no Estatuto para prolongar o seu mandato para além do previsto. E o nosso Obama teria que esperar mais uns anos para voltar a candidatar-se. A espera poderia ser longa, se tomarmos em conta a permanência de um mesmo presidente no poder no Alto de Itinga: uns 40 anos.
2. Se Obama fosse Tricolor, o mais provável era que, sendo um candidato da corrente da oposição, não teria espaço para fazer campanha. Os Bushs do Fazendão não toleram opositores, não toleram a democracia.
3. Sejamos claros: Obama é negro nos Estados Unidos. Na Bahia, ele é mulato. Se Obama fosse baiano, veria a sua raça atirada contra o seu próprio rosto. Não que a cor da pele fosse importante para os povos que esperam ver nos seus líderes competência e trabalho sério.
4. Se ganhasse as eleições, Obama teria provavelmente que sentar-se à mesa de negociações e partilhar o poder com o derrotado, num processo negocial degradante que mostra que, em certos clubes baianos, o perdedor pode negociar aquilo que parece sagrado – a vontade do povo em clamar por mudança. Nesta altura, estaria Barack Obama sentado numa mesa com um qualquer Maracajá em infinitas rondas negociais com mediadores medíocres que nos ensinam que nos devemos contentar com as migalhas dos processos eleitorais que não correm a favor dos ditadores.
Em “inconclusivas conclusões”, Mia Couto diz que os entraves são criados pelos “donos do poder, por elites que fazem da governação fonte de enriquecimento sem escrúpulos e que a África continuava sendo derrotada por guerras, má gestão, ambição desmesurada de políticos gananciosos. Depois de terem morto a democracia, esses políticos estão matando a própria política. Resta a guerra, em alguns casos. Outros, a desistência e o cinismo”.
Este texto, inspirado em Mia Couto, que por sua vez bebeu na prosa de Patrice Nganang, é universal, pois trata da luta da liberdade contra a ditadura; da justiça contra o arbítrio; da transparência contra a corrupção.
Barack Obama jamais poderia ser presidente do Bahia, porque o Esporte Clube Bahia tem dono. Depois de matar a democracia, o grande coveiro Paulo Virgílio Maracajá Pereira esquarteja, mais uma vez, o próprio Esporte Cube Bahia. Resta-nos a guerra. Ou o cinismo.
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