Após uma série de polêmicas e dois anos de discussões, a Timemania finalmente foi lançada nesta segunda-feira, em Brasília. A nova loteria da Caixa foi criada pelo Ministério do Esporte para pagar através do dinheiro dos apostadores as dívidas dos clubes de futebol com a Receita Federal, Previdência e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
Durante a solenidade, o presidente Lula não fez discursos. E se recusou a comentar o assunto com os jornalistas. Ao ser questionado se o projeto era um prêmio do governo para agremiações com administrações fracassadas e cartolas corruptos, preferiu não responder.
O presidente do campeão brasileiro São Paulo, Juvenal Juvêncio, falou em nome dos clubes e, como já se esperava, rasgou elogios à iniciativa. Desde que se falou em Timemania pela primeira vez, dirigentes de todo o País chegaram a estourar fogos e disseram, em uníssono, tratar-se da salvação do esporte nacional.
A situação se repetiu na Bahia. Não foram poucas as vezes em que, indagado sobre o vazio nos cofres tricolores, o presidente Petrônio Barradas depositou todas as suas esperanças no jogo. Idem para a cúpula do Vitória.
Mas há um grande porém nisso tudo, que parece não ser levado em conta, principalmente no Fazendão. É que, além de o Palácio do Planalto impor contrapartidas aos times, a distribuição das receitas da venda das cartelas será ínfima em relação aos que estavam na Série C, ano passado.
ENTENDA O CASO A previsão inicial de arrecadação com a Timemania é de R$ 500 milhões anuais. Deste valor, entretanto, apenas 22% vão para os clubes e eles terão cotas diferenciadas. Os 20 participantes da Série A ficam com 65%; os 20 da B, com 25%, e um terceiro grupo, formado por 40 agremiações, com somente 8%. É que, apesar de aparecerem 80 equipes no volante da loteria, outros 20 times, que seriam reservas em caso de desistências, fariam jus a 2% do valor.
Todos eles, ao entrar no programa, precisam confessar sua dívida à Receita e manter os novos recolhimentos em dia. O débito a ser coberto será parcelado em 240 meses (20 anos) e o clube ficará obrigado a complementar o pagamento mensal se a sua cota for insuficiente está aí o principal detalhe da história.
Por isso, mesmo que a Terceira Divisão receba 10% dos 110 milhões previstos às agremiações pela Caixa, a situação do Bahia seria complicada, tendo de desembolsar cerca de R$ 46 mil mensais para continuar `se beneficiando´ com a loteria, explica o economista da Associação Bahia Livre, Marcus Verhine. Ele chega a este número dividindo a dívida fiscal do tricolor, que estima em R$ de 25 milhões, pelos 240 meses do parcelamento acertado.
O resultado da conta dá R$ 104 mil, ao passo que o Bahia, por estar enquadrado no terceiro grupo, só deve arrecadar R$ 58 mil mensais necessitando, portanto, complementar a quantia para seguir no projeto.
O clube também não poderá atrasar nenhum imposto, sob pena de ser retirado do jogo. Então, essa tradicional prática adotada pelo Esquadrão não vai poder continuar. Assim, pergunta-se: será que o Bahia está realmente planejado para a Timemania? Os clubes do Rio já estão há meses falando em se reestruturar, mas nunca vi uma declaração de Petrônio, de ninguém, sobre o assunto, acrescentou.
Verhine explicou que a loteria pode até ser boa para os clubes, mas é muito melhor para o governo: É perfeito para o Fisco. O dinheiro não vai entrar diretamente nos times e, sim, numa conta específica da dívida confessada de cada um deles. As equipes só terão chance de utilizá-lo para contratações, por exemplo, depois de estarem quites com a Receita. Então, o governo se cobre, garantindo dívidas impagáveis, e ainda posa de fomentador do futebol nacional.
Para os clubes, o lado positivo é que, sem débitos exorbitantes, fica mais fácil de conseguir crédito, financiamento e investimentos junto a bancos e empresas. Times com patrimônio líquido negativo, como é o caso do tricolor, não podem obter empréstimos de instituições financeiras, ensina o economista.
FUTURO Mesmo assim, o vice-presidente de Marketing tricolor, Marco Costa, defende a participação do Bahia. O clube já sabia que era assim quando aderiu. Só que achava que ia subir em 2006, explicou, reconhecendo que, num primeiro momento, a loteria não é tão rentável, mas pensamos no conjunto, no que pode ocorrer no futuro.
Ele aproveita para garantir que o clube já cumpre todos os requisitos estipulados na lei da Timemania. E lembra que o Esquadrão de Aço terá participação nas apostas. Portanto, o torcedor também poderá apostar mais no time do coração, o Bahia, e nos ajudar, vislumbra.
Governo garante que não vai abrir `brechas´
De acordo com o economista da Associação Bahia Livre, Marcus Verhine, uma saída para o clube não se prejudicar tanto com a Timemania seria usar a sua força política e influência de fundador do Clube dos Treze. A idéia é tentar algum diferencial financeiro sobre os demais times que disputaram a Série C 2007, pois sua dívida é muito maior que a do restante deles.
Um dos idealizadores da loteria, o empresário José Carlos Brunoro lamenta a situação tricolor, porém é enfático: Se o Bahia deve muito, não é um problema da Timemania. Gerente da co-gestão Palmeiras/Parmalat, que fez sucesso na década de 1990, ele argumenta que a equipe é exceção entre as 80 a serem beneficiadas pelo projeto. Ninguém esperava que o clube fosse para a Série C. Então, realmente está numa situação atípica.
Brunoro assegura que o governo repartirá as receitas eqüitativamente por divisão do futebol nacional, sem analisar caso a caso.
Quando tivemos a idéia, pensamos em dois enfoques. O primeiro é que no mundo inteiro o Estado interveio para ajudar os clubes. Mas se a gente fizesse isso no Brasil, iam acabar dizendo que é um absurdo. Então, criamos a loteria com o objetivo de ser uma ajuda democrática para os clubes quitarem suas dívidas fiscais. A segunda missão, afirma, são as contra-partidas, que ajudarão a modernizar os clubes, forçando-os a andar em dia e com seus balanços auditados.
Quem também fala com pesar sobre o que acontecerá com o Bahia, mas sem ver possibilidades de o clube reverter o quadro, é o diretor do Departamento Técnico da CBF, Virgílio Elísio. Ex-presidente da Federação Bahiana de Futebol, ele é um dos oito integrantes da comissão elaborada pelo Ministério do Esporte para gerenciar o projeto.
Há realmente um grande problema. Não existe nenhum time da expressão do Bahia no grupo dos 40 que recebem a menor fatia do rateio. Mas é questão de escolha do clube: entrar e amenizar os débitos ou não entrar e não dispor dos recursos, considera. Elísio só não enxerga chances de o Bahia, politicamente, conseguir aumentar a sua parte: O padrinho dessa causa se candidataria a um processo de queimação.
Se o Bahia tivesse subido até 2006, as contas fechariam. Pelo rateio da Segundona, a equipe receberia algo em torno de R$ 114,5 mil mensais e não teria maiores problemas para honrar seus compromissos com a Receita Federal. Ao final dos 240 meses previstos pela Caixa, o que viria seria lucro.
RANKING DOS DEVEDORES
A dívida fiscal de alguns dos principais clubes do País:
Flamengo | R$ 180 milhões
Botafogo | R$ 160 milhões
Fluminense | R$ 155 milhões
Portuguesa/SP | R$ 145 milhões
Atlético/MG | R$ 112 milhões
Grêmio | R$ 80 milhões
Vasco | R$ 70 milhões
Santos | R$ 62 milhões
São Paulo | R$ 43,2 milhões
Cruzeiro | R$ 32 milhões
Corinthians | R$ 30 milhões
Bahia | R$ 30 milhões
Palmeiras R$ 27 milhões
Coritiba | R$ 20 milhões
Figueirense | R$ 6 milhões
Vitória | não divulgada
Fonte: www.globo.com (em valores aproximados)
Matéria publicada originalmente, por esse mesmo autor, na edição desta terça-feira 19/02/2008 do suplemento A Tarde Esporte Clube
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