Os cinéfilos de plantão certamente conhecem uma das maiores tramas de ficção científica da história, a trilogia oitentista spielberguiana “De Volta para o Futuro”. Nas películas em tela, um jovem adolescente viaja acidentalmente no tempo, e assim começa uma série de acontecimentos que terminam por mudar para sempre a sua história e a da sua família.
O personagem principal Marty McFly, um garotão baixinho, tem como um de seus pontos fracos ser alcunhado ou tido como covarde. Quando isso acontece, o nanico personagem fica nervoso, perde o controle de si e fica disposto a sair na mão com qualquer um, de Mike Tyson ao incrível Hulk. Na verdade, na versão brasileira Herbert Richers, a palavra “covarde” foi traduzida do inglês para o português a partir do termo original “chicken”, ou seja: “galinha” – expressão idiomática norte-americana usada para definir pessoas covardes; ou, em bom pernambuquês, “frango”, usado na terra do Santa Cruz para definir de pessoas covardes a homossexuais.
As galinhas são seres frágeis, cujo habitual comportamento é fugir desesperadamente diante da menor ameaça. Possuem pouca capacidade de autodefesa, e em nossa cultura gastronômica, invariavelmente acabam na panela dos humanos, excetuando-se veganos ou militantes de proteção aos animais em geral.
O comportamento do personagem do filme é fácil de compreender, à luz da teoria psicanalítica: Freud já explicava, há mais de cem anos, os mecanismos de defesa do ego, mormente o da projeção, quando o excesso de veemência em determinados comportamentos ou diante de acusações infundadas por parte de terceiros na verdade escondem a inquietude das nossas próprias sombras bem vigiadas pelas nossas personas. O baixinho do filme, em tese, não precisaria provar a ninguém sua coragem ou bravura, desde que o fosse de fato, porém reage agressivamente quando chamado covarde – ou galinha – no sentido de esconder, provavelmente, sua frustração por não ter compleição física para reafirmar seu pretenso status de macho alfa.
Finalizada a pequena explanação a respeito de prozac, cinema, aspirinas e uru… digo, galinhas, peço vênia aos amigos leitores para comentar sobre as lamentáveis cenas ocorridas no último clássico Ba-vi, ocorrido em plagas canabravianas no domingo passado.
No mundo do mimimi, das redes sociais e da hiperssensibilidade individualista, o comentário do jogador Vinícius a respeito de mães, irmãs e mulheres em geral poderia ter sido evitado, ok – tem até um tal de coach pra orientar essas coisas. Comemorações provocativas de gols, quaisquer que sejam, na frente da torcida adversária hoje são vistas como um ultraje gravíssimo, ok – além de serem passíveis de punição com cartões amarelos. Contudo, não é possível compreender, de fato, o porquê de tanta violência por parte dos jogadores do Inominável da Via Regional diante da tal comemoração; tampouco a dancinha de gosto duvidoso do Vinícius (referente a estilo musical de gosto igualmente duvidoso) pode ser equiparada a um balançar de genitália na cara dos adversários. O discurso excessivamente moralista, pugnando por respeito a um clube que nunca se deu ao respeito, pode soar estranho, mas Freud, certamente, explica. Marty McFly também.
Ora, ora, o clube da elite delirante e paranóica, tão bem conceituado por J.R. Tolentino em coluna passada, tão roubado por Osórios e Paulos, tão injustiçado por Fitos e Raudineis, é o mesmo clube do goleiro Tonho de trinta anos atrás. Freud tinha razão.
O que mais me causou espécie, em relação a este assunto, foi ver um comentarista de São Paulo, no afã de politizar a discussão imbecil, sugerir que a afrontosa dancinha, contrária à moral e aos bons costumes dos homens de bem, implicasse em cancelamento do contrato de patrocínio de banco estatal com o Bahia – fora outras besteiras ditas por comentaristas locais, as quais nem vou me dar ao trabalho de comentar.
Quanto às implicações legais da parafernalha em questão, aguardemos que a lei seja corretamente aplicada: nem mais nem menos, embora saibamos que, na lide, encontra-se um clube afeito a contratar jogadores por email finalizado com beijo-me-liga. De forma inexplicável e desproporcional, um clube que força o término de uma partida, então empatada, ainda quer que seu glorioso, imaculado e paradoxal nome seja sacralizado. Sigamos todos o Segundo Mandamento do Evangelho Segundo Kanu, e Vitória é a capital do Espírito Santo: Amém.
Saudações tricolores!
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