Logo após a promulgação da atual Constituição, o povo ainda aprendia a escolher seu candidato aos cargos eletivos sem censura e sem riscos de sofrer retaliações. Em Salvador, um programa de televisão da época denunciava implacavelmente os problemas da capital indo aonde o Estado raramente chegava; e cujo apresentador, valendo-se da alta popularidade angariada com tal atração, foi eleito numa composição política bem articulada e orquestrada pelo então partido majoritário do país. Ressalte-se que o tal programa disseminou o formato para todo Brasil e hoje incomoda muita gente.
A administração do prefeito-apresentador não foi das melhores. Em quatro anos, lixo, desordem, restos de obras de um bonde-metrô que só viria a sair ano passado (com formato bem diferente do original) e endividamento do Erário municipal foram apenas alguns fatos que caracterizaram a gestão desse prefeito. Não teria, a princípio, como fazer uma análise mais detalhada dos bastidores desse mandato, porém, o que minha memória gravou daquele período foram montanhas de lixo pelas ruas, manilhas e tubulações pelas avenidas e valas com mato crescendo no meio. Até aquela mosquinha colorida, a varejeira, foi apelidada com o nome do infeliz alcaide.
Também houve boas realizações naquele período, dentre as quais me lembro das melhorias no sistema de transporte coletivo. Mas, no geral, lembro-me principalmente daqueles restos de obra na Vasco da Gama, Ogunjá e Bonocô envolto a lama e buracos. O visível salta aos olhos. No final das contas, o tal radialista-prefeito caiu no ostracismo, mudou-se para o Rio de Janeiro e por lá terminou seus dias vítima de um câncer, sumindo para sempre da memória de Salvador.
Sem mais delongas:
Marcelo Apóstrofo da Santa Ana foi eleito pela maioria dos sócios do Bahia.
Os sócios que votaram nele certamente se arrependeram em boa parte: quiçá a esmagadora maioria desta maioria.
Por ora, não se conhecem atos flagrantemente ilegais e/ou criminosos do presidente do Esporte Clube Bahia que impliquem em sua expulsão do clube.
Se Marcelo renunciar ao seu mandato, terá sido um ato personalíssimo e unilateral da sua parte.
Se houver a aludida renúncia, restará provado, salvo excepcionalidades que a justifique, que Marcelo além de incompetente será um reles covarde, prejudicando inclusive a consolidação do processo democrático do clube.
Não se conhece, em política, que inexperiência administrativa seja empecilho, desde que o mandatário saiba delegar, centralizar quando necessário e tomar decisões acertadas.
Ainda lhe restam mais dois anos de mandato – período em que ele pode consertar o que fez e deixou de fazer; ou em que a torcida contará os dias para dezembro de 2017.
Estes são fatos que não podem ser olvidados por ninguém.
Aprendemos, neste primeiro ano, que marketing é bom na eleição, mas não tão bom quanto ao programa de sócios, aparentemente excludente e elitista. Aprendemos que a propaganda é a alma do negócio, mas venceu uma proposta, em essência, muito parecida com as outras. Aprendemos também que uma empresa tem áreas-meio e áreas-fim; e que o essencial está nas ações finalísticas. De nada adianta a máquina gerencial estar bem azeitada se o “eleven” dentro de campo perde e empata de dois rebaixados da forma mais vergonhosa possível, com jogadores se arrastando em campo.
Os salários estão em dia, mas talvez falte liderança focal, comando, ou algo do tipo. Não vejo tanta ruindade nesse elenco de 2015 exceto ações equivocadas, desencontradas e atabalhoadas no produto maior do Bahia que é o futebol. Se o funcionário não rende, conforme rezam as cartilhas corporativas mais modernas, a culpa é do seu líder até prova em contrário: do encarregado, do chefe de seção e até mesmo do treinador ou diretor de futebol que não foi corretamente avaliado pelo seu superior.
O tempo trará outros aprendizados. Haverá outros Fernandos Josés em nossa vida, afinal de contas é assim que é a política. Inclusive a política, enquanto relações interpessoais, pode criar um ambiente de pressão de modo que o presidente tricolor desça do pedestal e tome ações mais adequadas no ano que vem.
Falar é bom, mas fazer é melhor ainda. Como diria o deputado-palhaço, se fosse fácil todo mundo era. E assim segue o Bahia em sua sina de torcida de primeira, clube de segunda e mentalidade de terceira há décadas. Que os avanços das áreas-meio continuem e sejam seguidos por todos os dirigentes doravante, mas o torcedor quer ver gol, e isso é tão velho quanto o próprio futebol.
A síndrome de Fernando José tem cura. A cura está no próprio torcedor/sócio quando entender que o caminho do sucesso é muito mais difícil do que eleger o salvador da pátria ou o jornalista que um dia resolveu entrar numa composição política majoritária visando ser o ícone de uma nova geração, e repetiu as velhas práticas que tanto combatia. Talvez o maior erro esteja no excesso de expectativas do que em mais uma gestão – até o momento – incompetente para levar o Bahia à condição de protagonista nacional quando mal consegue sê-lo em nível regional.
Saudações Tricolores!
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