O movimento de libertação do Bahia precedeu os recentes movimentos sociais que se espalham Brasil adentro. É marcante o sentimento de se perceber fazendo parte de um momento histórico tão relevante como este por que passa o país.
E interessante é notar como se formam ondas que, em dado momento, arrebentam da consciência coletiva e passam a constituir marcos civilizatórios a caracterizar um novo tempo, uma nova forma de ver o mundo e nele se situar, em contraposição a algo que se transforma em obsoleto. O velho Brasil tornou-se obsoleto. O arcaico Bahia da Península Itapagipana, que por mais de uma década roubou a identidade do antigo Bahia de glórias e tradições, também. Acontece que o despertar da Nação Tricolor antecedeu ao da nação brasileira.
Embora o quase sincronismo dos movimentos, o de resgate do Bahia da torcida precedeu ao do povo brasileiro em geral, na sua busca por melhores condições de vida e pelo combate ao desperdício e à malversação do dinheiro público, neste país de elevadíssima carga tributária e de serviços públicos cambaleantes, notadamente nas áreas essenciais da educação e da saúde.
A Bahia e seu povo gozam merecidamente da fama de pioneiros. Foi aqui que a primeira leva de estrangeiros registrou para a história o descobrimento de uma nova e auspiciosa terra brasilis e aqui mesmo se fez a primeira capital da antiga província de Portugal. Aqui brotaram precursores nas artes, nas letras, na poesia, na música, no Direito, na Medicina, enfim, nomes de destaque nas mais diversas áreas do saber, e não nos deixam mentir Gregório de Matos, Castro Alves, Rui Barbosa, João Gilberto, Anísio Teixeira, Elsimar Coutinho, dentre muitos outros, tanto ou talvez, ainda, mais notórios do que estes.
Pois bem, a torcida do Bahia também se inseriu na História ao tornar-se a primeira de que se tem notícia no Brasil a se mobilizar de modo tão articulado e profícuo, com base na inteligência típica dos baianos. E não à toa se diz que baiano burro nasceu morto. O movimento do torcedor do Bahia jamais careceu descambar para a violência a fim de vencer os seus inimigos intestinos que, de modo vil, se apoderaram do seu objeto de paixão, o Baêa, na busca da satisfação dos seus desejos mesquinhos, os quais em nada coadunavam com os da Nação Tricolor.
É engano pensar que as consciências dos magistrados não se influenciam pelo clamor popular. Ainda mais, quando nitidamente justo, como é o caso desta bendita mobilização em prol da libertação, da decência e da democratização do Bahia. As leis se constituem para que se faça a justiça. Visando ao alcance do justo, subsuma-se a lei.
Na Grande Depressão de 1930, nos Estados Unidos da América, todos sabiam dos atos criminosos de Al Capone, mas somente se conseguiu grampeá-lo em virtude de prosaica sonegação de impostos, um crime, no Brasil, considerado de menor poder ofensivo do que outros que, sabidamente, o famoso bandido estadunidense praticava. Mas, sabemos também, o resgate da verdade absoluta é impossível. Afinal, a história são versões dos fatos e não os fatos em si. Portanto, contentemo-nos com a verdade possível.
As obscuridades reinantes em mais de dez anos em que se impingiram sofrimentos e humilhações a nós, torcedores do Bahia, não vieram à tona na íntegra, ainda, como motivadoras desse processo de intervenção judicial. O que nos importa, mesmo, neste momento auspicioso e histórico, é que a ação de um nobre tricolor, o conselheiro do clube, expurgado por ousar se levantar contra os desmandos e o autoritarismo imperantes nas hostes tricolores nesse período de trevas que esperamos findado, tornou-se o nosso imposto sonegado, foi o que nos fez vislumbrar o alcance do nosso intento de vermos ressurgir um novo Bahia, afinado com as suas tradições, nascido para vencer, tantas vezes campeão, da Bahia, do Nordeste, do Brasil.
Contudo, a auditoria determinada pelo juiz Paulo Albiani poderá fazer emergir o que se escondeu por esses longos anos debaixo dos tapetes desse Bahia tomado de assalto das mãos daqueles que verdadeiramente o amam. O Bahia está sendo conquistado pela sua torcida.
Em que pese a mobilização da torcida ser mola propulsora deste processo revolucionário que vivenciamos no Bahia, destacam-se alguns homens pela coragem e atitudes até aqui adotadas. Esses homens tornaram-se dignos do mais elevado reconhecimento por parte da Nação Tricolor. São eles: Jorge Maia, pela iniciativa de mover esta ação judicial que está transformando, para muito melhor, se Deus quiser, o nosso clube; o juiz Paulo Albiani, que, com sua determinação e lucidez afinada aos legítimos anseios populares, está fazendo reavivar em nós, torcedores, o sentimento de que a justiça é algo possível e de que os poderosos a ela não são imunes; o interventor Carlos Rátis, que parece ter sido a pessoa certa escolhida para adotar as primeiras atitudes visando à democratização do Bahia, à entrega do clube àqueles que verdadeiramente o amam, os seus torcedores.
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